terça-feira, 30 de junho de 2009

Vilhena comemora 100 anos da passagem de Rondon

JÚLIO OLIVAR - Nesta segunda-feira comemorou-se o centenário em que a expedição com 42 homens do Exército, comandada pelo tenente Cândido da Silva Rondon, chegava ao Planalto dos Parecis para instalar a Estação Telegráfica Vilhena. O nome foi dado por Rondon em homenagem ao maranhense Álvaro de Melo Coutinho Vilhena, ex-diretor dos Correios e Telégrafos, morto no Ceará cinco anos antes da Expedição.

Parte desta história está sendo contada em vídeo e fotografias, através do Projeto Hatisu, desenvolvido em conjunto pela Secretaria Municipal de Esportes e Cultura e Associação Comercial e Industrial de Vilhena (Aciv), com a colaboração de diversos vilhenenses.

Apesar da importância da data, a estação telegráfica, que virou museu há 29 anos, está abandona pela prefeitura desde 1996.

á era hora. A prefeitura resolveu, embora tardiamente, se mexer no sentido de que a população saiba que 2009 é o ano do centenário da primeira passagem do tenente Cândido Mariano da Silva Rondon – mais tarde transformado no legendário marechal – pelas terras onde fica hoje o município de Vilhena. Até agora, a poder público não havia reverenciado a epopéia militar que constitui o marco da colonização, assinalada pela “pacificação” dos indígenas e a integração de Rondônia ao resto do país através das linhas telegráficas.

A expedição era composta por 42 homens. Os principais auxiliares de Rondon eram o zoólogo Alípio de Miranda Ribeiro; o médico Joaquim Tanajura e os tenentes João Salustiano Lira, encarregado do serviço de observações astronômicas e serviço de vanguarda; Emanuel Silvestre de Amarante (o Major Amarante, nome da avenida principal da cidade), incumbido dos levantamentos topográficos; Alencarliense Fernandes da Costa, comandante do comboio de reforços; e Antônio Pirineus de Souza, comandante de pelotão.

Exatamente em 29 de junho faz cem anos que a Comissão de Rondon armou acampamento na área onde ficava a extinta Estação Telegráfica Vilhena, que mais tarde foi transformada no museu Casa de Rondon. A área ficou conhecida a partir da década de 1960 como “Vilhena Velha”, em cujo entorno existiam várias casas rudimentares, que foram sendo sendo abandonadas por causa do nascimento no novo núcleo urbano às margens da rodovia BR 364, onde efetivamente a cidade de Vilhena se desenvolveu.
Em parceria com a Aciv (Associação Comercial e Industrial de Vilhena), a Secretaria Municipal de Esportes e Cultura (Semec) lembrará a data de forma bem modesta: instalará seis banners com fotos e textos alusivos à data no estande da Aciv na 24ª Expovil (Exposição Agropecuária de Vilhena). Também será mostrado no local um documentário em vídeo, produzido por Irio Martinovski, com fotos e a narração da história vilhenense desde a chegada de Rondon.

“Estas iniciativas fazem parte do Projeto Hatisu, desenvolvido pela Semec, e são o primeiro passo para algo mais amplo e que envolve diversos parceiros”, explica o professor de Língua Portuguesa Cledemar Jéferson Batista, colaborador dos trabalhos. Hatisu quer dizer “cesto” na língua nambiquara. “O sentido é valorizar a língua nativa e dar a conotação de que há cesto de informações pertinentes à região”, explica Batista.

O projeto terá prosseguimento durante todo o ano com exposições itinerantes nas escolas e na biblioteca municipal. “Esperamos que em 2011 tenhamos a Casa de Rondon reformada. Neste ano comemoraremos os cem anos da inauguração da estação telegráfica”, lembra o professor.

Apesar da boa vontade e do voluntarismo dos envolvidos no projeto, Vilhena padece do abandono – já há 13 anos – da Casa de Rondon, que deu origem à cidade. Sobre o assunto, João Carlos Regert Neto, agente administrativo da Semec, responde que, ao contrário do que parece, tem havido empenho da administração municipal para recuperar o imóvel.

“Há duas frentes de trabalho neste sentido. Primeiro, a articulação para que a área em que está a casa seja doada pelo Ministério da Defesa ao Município. Em seguida entra a necessidade de que o museu seja tombado pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional”, esclarece Regert Neto. Depois de cumpridas estas etapas a construção poderá ser recuperada.

Ainda de acordo com Neto, o município tem se preparado para gerir o museu. “Além de estarmos recuperando o material fotográfico e documentos históricos, participamos, em Porto Velho, de uma série de oficinas oferecidas pelo Instituto Brasileiro de Museus para que o acervo seja mantido de acordo com os critérios desta ciência”, garante o servidor.

O centenário da passagem da expedição militar pelo Planalto dos Parecis ocorre num momento em que Vilhena ganha novos contornos em sua arquitetura. Do rudimentar casebre onde funcionou a estação aos dias de hoje, com prédios modernos no centro, o shopping center em construção e a fama de ser “a Suíça do norte do Brasil” pelos seus indicadores econômicos, a cidade precisa ainda aprender a lição de preservar sua memória. “Isso é importante no processo de construção de sua identidade”, salienta o músico e escritor Mário Guerreiro Mileo, da Academia Vilhenense de Letras.

A CASA ABANDONADA
O índio aculturado Marciano Zonoecê, do estado do Mato Grosso, era telegrafista. Ele e sua mulher, Maria Augusta, viveram e administraram a estação telegráfica durante 26 anos, a partir de 1943. Sete de seus oito filhos nasceram no local. Antes deles, outras pessoas estiveram à frente da estação, mas não deixaram registros e, por isso, os Zonoecê são os primeiros moradores conhecidos foram das aldeias.

Eles se mudaram da estação em 1969 para ficarem em segurança mais perto dos novos moradores não-índios – incluindo militares do 5º Batalhão de Engenharia e Construções (5º BEC), temendo os seguidos ataques de cinta-larga que chegaram a matar seringueiros na região, além de ferir com flecha uma filha de Marciano.
“Após a mudança da família Zonoecê para o novo núcleo populacional, a Casa de Rondon ficou abandonada por 11 anos, sendo reconstruída pela prefeitura em 1980, na administração do prefeito coronel Arnaldo Lopes Martins. Naquele ano foi hasteada em frente à casa a bandeira nacional pelo governador, coronel Jorge Teixeira”. Quem conta esta história é o professor Roberto Scalércio Pires, então tenente do 5º BEC e secretário de Administração e Fazenda da prefeitura. O museu funcionou durante cerca de 15 anos e, ao lado, havia um zoológico. Ambos desativados em 1996.

Roberto Pires, que também é formado em engenharia civil, lembra que a atual Casa de Rondon tem as mesmas características arquitetônicas da construção primitiva. “No entanto, boa parte dos tijolos e o telhado são de 1980”, recorda. Na época da reconstrução, toda a área foi escavada sob o comando do servidor municipal José Romeu Medeiros, que mora agora em Viamão (RS). Foram encontrados muitas ferramentas, peças de ferro e de telégrafo. Mas, não encontraram o “ouro escondido no local por Rondon”, conforme rezava a lenda.

Pires foi colega de farda de um neto de Rondon, o então tenente Antônio Lara Marialva Rondon, que foi chefe de residência especial do 5º BEC de Vilhena, por volta de 1976.

Autoria: Júlio Olivar